sexta-feira

Anneliese, possessão penitencial


Anneliese, possessão penitencial

"O demônio abomina água-benta e objetos consagrados.
Ele tem medo do nome de Jesus e da oração".
(Do Exorcismo de Anneliese Michel)

O CASO RELATADO a seguir constitui impressionante exemplo de possessão penitencial ou oblativa, na qual a vítima sofre essa dura provação para, segundo os desígnios insondáveis de Deus, expiar pecados alheios e obter para si própria, ou para outras pessoas, graças espirituais de santificação e de reavivamento da fé.

Um caso muito bem documentado

A razão da escolha deste caso deve-se a que os fatos se passaram praticamente em nossos dias (de 1974 a 1976), e alcançaram grande repercussão na imprensa, estando muito bem documentados, uma vez que os exorcismos foram gravados em fitas magnéticas e o caso foi parar nos tribunais alemães.

Seguimos aqui o livro da Dra. Felicitas D. Goodman, antropóloga americana não-católica, que estudou o caso por interesse acadêmico, aplicando ao exame do mesmo o rigor científico. Ela reuniu toda a documentação a respeito, inclusive as fitas magnéticas com a gravação dos exorcismos. (Felicitas D. GOODMAN, The Exorcism of Anneliese Michel, Doubleday, New York, 1981, 255pp.   A Dra, Goodman utilizou 42 fitas cassete com a gravação dos exorcismos, fornecidas pel o Pe. Ernst Alt, um dos exorcistas, e um dossier de mais de 800 páginas de documentos, proporcionados pela advogada da família Michel, Dra. Marianne Thora (depoimentos, cartas, laudos periciais, etc).

Menina inteligente, alegre e piedosa

Anneliese Michel nasceu em 21 de setembro de 1952 em Leiblfing, na Baviera, sendo a mais velha das quatro filhas do casal Josef e Ana Michel, católicos praticantes. Ainda na infância, a família mudou-se para a pequena cidade vizinha de Klingenberg.

Anneliese era inteligente e piedosa, embora sua infância tenha sido marcada por contínuas doenças, o que preocupava muito sua mãe, que já havia perdido uma filha em baixa idade. Ela fez Primeira Comunhão com todo o fervor. Terminado o curso primário em sua cidadezinha, passou a viajar de trem com outras meninas, para cursar o ginasial numa cidade vizinha.

Era uma menina alegre, tocava acordeon e aprendia piano.

Quando completou dezesseis anos, entretanto, começaram a manifestar-se os sintomas de uma doença de caráter neuro-psiquiátrico, que os médicos diagnosticaram como epilepsia, prescrevendo o tratamento correspondente.

Incontrolável repulsa pelas coisas sagradas
Ao mesmo tempo, surgiram outros sinais mais inquietadores: uma estranha e incontrolável repulsa pelas coisas sagradas, dificilmente de entrar em igrejas.

A jovem fazia esforços para vencer essa estranha repugnância, esses impulsos veementes, porém nem sempre obtinha êxito.  Certa vez, ao tentar entrar em uma capela dedicada a Nossa Senhora, na Itália, onde tinha ido em peregrinação, não conseguia avançar um passo, pois o chão lhe queimava os pés, como se estivesse em brasas. Em diversas ocasiões, quando pretendia levantar-se do lugar para ir comungar, seus membros pareciam pesados como chumbo e ela não conseguia mover-se. Um dia sua mãe a surpreendeu fazendo caretas de ódio e arreganhando os dentes para um crucifixo.

Apesar dessas manifestações anormais, que iam se tornando cada vez mais intensas, a moça foi-se tomando mais religiosa e ligada a outras moças igualmente piedosas; ao mesmo tempo mantinha um namoro casto e bem intencionado com um colega de classe.

Exame cuidadoso revela possessão

A partir de 1974, Anneliese, por causa das perturbações acima referidas, principiou a procurar o Pe. Emst Alt, seu pároco, o qual lhe dava uma simples bênção, com o que ela se sentia aliviada.

A falta de melhora com o tratamento médico, ao contrário do alívio que experimentava com as bênçãos, e a presença de sinais estranhos que aumentavam dia a dia, levaram Anneliese, seus parentes, amigos e igualmente o sacerdote que a assistia, Pe. Alt, à convicção de que se tratava de alguma influência diabólica. Vários sacerdotes doutos examinaram a moça, entre eles o Pe. Adolph Rodewyk S.J., conhecido especialista em demonologia e possessão, com importantes obras publicadas sobre a matéria.

O pároco fez então vários pedidos ao bispo de Würzburg, Dom Joseph Stangl, no sentido de obter a devida licença para a realização dos exorcismos solenes. Depois de muito hesitar, o bispo, por fim, em setembro de 1975, deu autorização para que se procedesse a eles, nomeando exorcistas para aquele caso o Pe. Arnold Renz, salvatoriano, antigo missionário na China e Superior Religioso, e o própio pároco da moça, Pe. Ernst Alt.

Vítima expiatória

De fins de 1975 a junho de 1976 foram realizados inúmeras sessões de exorcismos, durante as quais ficou claro que os demônios não tinham licença para abandonar sua vítima, pois se tratava de uma possessão oblativa, em que a moça sofria como vítima expiatória.

Simultaneamente, o tratamento médico prosseguia, porém se mostrava ineficaz, pois os médicos se apegaram ao diagnóstico de epilepsia, sem que os exames de eletroencefalografia fossem concludentes.

Por fim, os demônios foram expulsos, porém, quando os presentes entoavam cânticos de ação de graças, eles se manifestaram de novo, dizendo que tinham recebido licença para voltar.  Os exorcismos recomeçaram, mas os demônios diziam que não tinham licença de Deus para sair, e essa situação ainda iria durar algum tempo.

Finalmente, em meio ao exorcismo do dia 30 de junho, repentinamente, Anneliese, com sua voz normal, gritou: “Por favor, absolvição”. O sacerdote imediatamente atendeu o apelo e encerrou os exorcismos.

Na manhã seguinte a moça foi encontrada morta em sua cama.

Vingança do demônio

Apesar de todos os esforços da família e dela própria, a moça passara longos períodos sem conseguir alimentar-se, caindo em um estado de desnutrição e fraqueza generalizada. Em vista disso, o médico negou-se a dar o atestado de óbito e foi aberto um processo judicial contra os pais e os exorcistas, por omissão de socorro médico. Em 21 de abril de 1978 eles foram condenados a seis meses de prisão, notícia essa que foi amplamente divulgada pela imprensa  em todo o mundo.

Toda aquela dolorosa e humilhante provação foi muito útil para o aperfeiçoamento espiritual de Anneliese e de sua família, bem como dos próprios sacerdotes exorcistas.

Após a morte da moça, seu túmulo no cemitério de Klingenberg passou a ser local de peregrinação, para o qual afluem pessoas não só da Alemanha, mas do Exterior, para rezar e pedir graças.

Gritos roucos, guinchos e grunhidos furiosos: a voz do Inferno

As transcrições de trechos das gravações dos exorcismos que a Dra. Goodman faz em seu livro permitem-nos formar uma pálida idéia da luta dos exorcistas com o poder das trevas.


Não cabe transcrevê-los todos aqui, de maneira que damos alguns excertos como amostra, terrível amostra da voz do próprio demônio. Eis o que diz a Dra. Goodman:

“Na fita original nós sentimos, como os que cercavam Anneliese, algo dessa presença autônoma e alienígena que, no sentido do dogma católico, estabeleceu sua residência no corpo da moça, que usa para os seus propósitos demoníacos.

“Há os gritos ondulados e roucos e os guinchos e grunhidos furiosos que caracterizam o demônio - conforme os ensinamentos da Igreja - alienígena das profundidades, emissário das trevas, de tudo aquilo que é amedrontador e poluído. Os sons infernais fervem e chocam-se formando de vez em quando algumas palavras ou frases. E quando isso acontece, quando o demônio fala, a força do mal transforma-se numa pessoa. Não porém uma pessoa qualquer, porque fala no dialeto da Floresta Bávara, no linguajar de mercado, ele o demônio medieval nas obscenidades de seus assaltos verbais contra o padre”.

Malefício feito por inveja

"Ele toma as palavras latinas do sacerdote, e responde a elas com revolta: Immaculata (Imaculada)... ‘Você com suas porcas palavras...nem você acredita nisso’. Saecula saeculorum (Pelos séculos dos séculos)...’Não é verdade, nem se devia falar isso aqui.’  Educto (Retira-te)... ‘Pode falar o dia todo, eu não vou sair’. Ut discedas ab hac famula dei Anneliese (Para que abandones esta serva de Deus Anneliese) ... ‘Não, não, ela pertence a mim, dê o fora daqui velha carcaça”.

"É a aldeia que vive e respira na resposta da questão de porque Anneliese estava possessa: ‘Ela não havia nascido ainda quando foi amaldiçoada’ — revela um dos demônios. Uma mulher fez o malefício por inveja. Quem era ela? ‘Uma vizinha de sua mãe em Leiblfing´— responde o demônio.”

A moça está possuída por vários demônios. Em determinado momento um deles deixa escapar seu lamento infernal, no qual não entra nenhum arrependimento, apesar da intensidade do sofrimento:
"Danados por toda a eternidade, o-oooh!”.

Demônios abominam água-benta, têm medo do nome de Jesus

De uma outra sessão de exorcismo:

"O padre pode também obrigar o demônio a dizer o que é nocivo para ele e encurralá-lo como o faria um senhor contra seus súditos rebeldes."

"Os assistentes do exorcismo descobrem que o demônio abomina água-benta e objetos consagrados. Eles têm medo do nome de Jesus, da imitação por alguém da vida de Jesus, da oração. 'Reze, diz um dos demônios, e nada pode realmente acontecer de mau com você, seu porco imundo! ... Mas felizmente não muitos acreditam mais nisso’. Eles não toleram as súplicas a São Miguel. cuja missão é a de expulsar para o inferno os espíritos vagando pelo e tentando as almas.

“Eles temem o Anjo da Guarda e gritam de horror quando a Ladainha das Cinco Chagas de Jesus é entoada: ‘Eu saúdo a adoro a chaga sagrada de vossa mão direita, oh Jesus’. Deixam-se levar por um verdadeiro furor quando chega a invocação da Quinta Chaga: ‘Eu saúdo e adoro a chaga do vosso Sagrado Coração, e nessa chaga eu escondo a minha alma’. Então essas orações são repetidas continuamente, como uma potente ameaça, uma arma invencível para expulsar a horda infernal.

“Estou condenado porque não quis servir a Deus!”

“A arma mais efetiva que os padres têm contra o demônio é o interrogatório, submetê-lo a questões. Aqui os demônios estão em desvantagem, pois eles não podem fazer o mesmo e interrogar o padre. O padre faz um uso agressivo do interrogatório durante todo o exorcismo. Suas questões martelam o demônio incessantemente, voltando sempre ao mesmo ponto: Porque eles estão naquele corpo? Quantos e quais são os demônios presentes? Quando eles sairão? Que mensagens da parte da Mãe de Deus eles têm? Porque eles caíram no Inferno?”

Em um dos exorcismos, obrigado pelo sacerdote, um dos demônios explica a causa de sua danação: “Eu estou danado porque eu não quis... eu não quis servir.., a Deus!. Eu queria ser a regra para mim mesmo, embora eu fosse uma mera criatura”.

De outro exorcismo: “Eu... vou dizer algo”, diz um demônio. Segue-se uma série de gritos e blasfêmias, e ele prossegue: "Ela (Nossa Senhora) está feliz com vocês todos” e seguem-se mais gritos. “Porque vocês continuam a rezar. Vocês devem continuar o quanto vocês puderem” — novos gritos e blasfêmias.

"Fui para o inferno porque me desesperei”
O padre impôs como sinal de que os demônios sairiam que eles, ao sair dissessem: Ave Maria! Cheia de graça. Eles relutaram de todo modo mas, pela força do poder exorcístico, foram obrigados a aceitar. Quando chegou a vez de sair o demônio que se chamava a si mesmo de Judas, deu-se o seguinte diálogo:

"Judas Iscariotes, você está aí?” Gritos. O Pe. Renz repete a fórmula exorcística de mando, ouvem-se gritos do demônio. E depois a confissão:

"Eu fui para o inferno porque eu me desesperei”. (O demônio fala como se fosse o próprio Apóstolo traidor.)

 "Porque você traiu o Salvador?"

"Sim ... mas eu não vou sair?". Ele continua resistindo até que o Pe. Henz repete três vezes mais a fórmula exorcística e lembra ao demônio a ordem dada por Nossa Senhora para que ele saísse.: ‘Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, em nome da Santa Mãe de Deus...”. Judas continua desafiador: “Não... não... não... não!’

"Em nome de...”
"Judas tenta negociar: ‘Para onde eu devo ir?’
"Para o Inferno."
"Não”
"É lá que é o seu lugar!"

"Não!"
"Você deve ficar lá! Você não quis servir ao Senhor!"
"Judas não pode mais resistir. Seus gemidos e gritos são mais assustadores do que antes. Uma vez mais o Pe. Renz repete a ordem, e então diz enfadado: ‘Vamos, sáia’. Judas saúda a Virgem e sai.  Renz se distende um pouco”.

"Muitas almas estão sendo salvas por este sofrimento”
O caráter penitencial dessa possessão se depreende de todo o conjunto da história e da atitude da moça, e foi posto em relevo por um dos exorcistas, o pároco Pe. Alt, em uma carta de 24 de junho de 1976 ao bispo de Würzburg:

 “Nós não estamos conseguindo forçar o demônio a falar novamente. Isto, me parece, se deve ao fato de que nós estamos lidando com um caso típico de possessão penitente. Em várias conversas que eu tive com a moça recentemente, ela me deixou entender que as coisas ainda ficarão piores para si. Estava muito amedrontada triste com isso. Mas disse que deve passar por isso também.  No caso de uma possessão penitente, as coisas ficam muito difíceis para o exorcista, porque é muito difícil entender o significado da penitência. Isso foi o que o Pe. Rodewyk S.J. de Frankfurt, me disse. A única consolação que temos é que muitas almas estão sendo salvas por este sofrimento”.

Este caso ilustra bem como o exorcismo, apesar de seu poder sobre os espíritos infernais, está condicionado à vontade de Deus, que muitas vezes pode retardar a saída do demônio segundo algum desígnio seu, como o da provação e santificação da pessoa.

É igualmente muito revelador quanto ao que foi dito anteriormente, sobre à incapacidade do demônio de penetrar no fundo da alma. Pois mesmo quando tem permissão de Deus para possuir o corpo de uma pessoa, e de atuar em suas faculdades inferiores, o demônio jamais tem o poder de fazê-la pecar, de impedi-la de continuar unida a Deus, de progredir na virtude e se santificar, como foi o caso de Anneliese Michel. Por isso cabe bem lembrar aqui o que dizem os santos: deve-se temer a pecado do que o demônio.
 (Fonte: internet. Autoria:“Anjos e Demônios - A Luta Contra o Poder das Trevas”, Gustavo Antônio Solímeo - Luiz Sérgio Solímeo)


Sem comentários:

Enviar um comentário