O
admirável mundo angélico
AS NOÇÕES que correm entre os fiéis, mesmo dentre os
mais fervorosos, a respeito dos santos anjos são muito vagas e superficiais.
Meras reminiscências e imagens da infância, na maioria dos casos, não muito
diferentes de entidades fictícias e de algum modo mitológicas, como as fadas e
os duendes.
A iconografia corrente, infelizmente, não ajuda a
dar a conhecer a verdadeira fisionomia dos anjos, apresentando-nos seres
alados, com vestes e aspecto feminino; ou, então, anjinhos bochechudos, com
cara infantil e tola, brincando despreocupadamente sobre nuvens que mais
parecem flocos de algodão doce...
Esses anjos não existem, nem é deles que tratamos
aqui.
A partir dos dados da Sagrada Escritura e da
Tradição, dos escritos dos Santos Padres, do ensinamento do Magistério
eclesiástico, da lição dos Doutores e teólogos, queremos apresentar a
verdadeira natureza dos santos anjos: seres puramente espirituais, dotados de
uma inteligência agudíssima e de uma possante vontade livre dominando abaixo de
Deus sobre todas as demais criaturas, racionais e irracionais, bem como as
forças da natureza, os elementos da atmosfera e subjugando para sempre os
espíritos infernais.
Eis os santos anjos, príncipes dos exércitos do
Senhor, mas também nossos amigos e protetores.
O
admirável mundo angélico
"E
ouvi a voz de muitos anjos
em
volta do trono...
e
era o número deles
milhares
de milhares".
( Ap
5,11)
ALÉM DO MUNDO VISÍVEL e material, criou Deus também
o mundo invisível e espiritual, o admirável mundo angélico.
A existência dos anjos foi negada na Antiguidade,
entre judeus, pela seita dos saduceus (cf. At 23, 8). Mais tarde, por certas
seitas protestantes, como os anabatistas. Em nossos dias ela tem por
adversários os ateus, materialistas e positivistas, que não crêem senão naquilo
que seus olhos vêem e seus sentidos apalpam. Os racionalistas, para encontrar
uma excusa aparentemente racional à sua incredulidade, alegam que os anjos
foram inventados pelos judeus no tempo do cativeiro da Babilônia, por imitação
das entidades ali cultuadas; ou, então, consideram os anjos como simples modo
poético e simbólico de referir-se às virtudes divinas e aos vícios humanos...
Contra todos esses, falam os dados da razão, a
crença comum dos povos e a revelação divina.
Os anjos
existem
Pela simples razão, independentemente da revelação,
o homem pode chegar de algum modo ao conhecimento da existência dos anjos. Com efeito,
a existência de seres puramente espirituais não repugna à razão. E um exame da
criação, à mera luz do intelecto pode levar-nos à conclusão de que a existência
de criaturas puramente espirituais convém à harmonia do Universo, pois assim
estariam representados os três gêneros possíveis de seres: os puramente
espirituais, acima do homem; outros, puramente materiais, abaixo do homem; por
fim, seres compostos, dotados de matéria e espírito — os
homens. E a crença comum dos povos, constante em todos os lugares e em todas as
épocas, sempre afirmou a existência desses seres de natureza superior aos
homens e inferior à divindade.
Uma coisa, porém, é a mera possibilidade da
existência de seres puramente espirituais, e outra é a sua realidade objetiva.
A existência dos anjos (e dos demônios, anjos decaídos) seria para nós um
problema insolúvel, não houvesse a tal respeito especial revelação divina por
meio da Escritura e da Tradição,* que nos garantem a certeza da existência dos
anjos.
* Tradição, em sentido amplo, é o conjunto de
idéias, sentimentos e costumes, como também de fatos que, numa sociedade, se
transmitem de maneira viva de geração a geração.
Em sentido estrito teológico, chama-se
Tradição o conjunto de verdades reveladas que os apóstolos receberam de Cristo
ou do Espírito santo, e transmitiram, independentemente Sagradas Escrituras, à
Igreja, que as conserva e transmite sem alteração. Essa revelação foi feita a
nossos primeiros pais, e se conservou na Humanidade, por via de
transmissão oral pelos Patriarcas. Com o tempo (e também por obra do demônio,
sem dúvida), essa revelação primitiva foi-se corrompendo, restando dela meros
vestígios no paganismo antigo e no atual. Nas brumas desse paganismo
encontramos seres incorpóreos, ora malfazejos ora benignos, quase sempre
cultuados como divindades ou quase-divindades. Para preservar o povo judeu da
contaminação por essa deformação politeísta pagã, os Autores sagrados, durante
largo período, evitaram mencionar nominalmente o espírito das trevas. E, pela
mesma razão, não se encontram muitos pormenores no Antigo Testamento sobre a
natureza dos anjos e dos demônios, embora sejam mencionados a cada passo. A
revelação definitiva só se verifica Nosso Senhor Jesus Cristo. Porém, a Bíblia não
traz toda a revelação sobre o mundo angélico, sendo necessário recorrer à
Tradição, Esta, como se sabe, encontra-se recolhida nos documentos dos Santos
Padres* e escritores eclesiásticos dos primeiros tempos, assim como nos
documentos do Magistério - Papas e Concílio - na Liturgia e nos monumentos da
Antiguidade cristã (catacumbas cemitérios, etc.).
*Chamam-se Santos Padres ou Padres da Igreja certos
escritores eclesiásticos antigos, que se distinguiram pela doutrina ortodoxa e
santidade de vida e são reconhecido Igreja como testemunhas da tradição divina.
A existência dos anjos é uma verdade de fé,* provada
pela Escritura e pela Tradição. A Sagrada Escritura refere-se inúmeras vezes a
seres racionais, inferiores a Deus e superiores aos homens; logo, segundo ela,
esses seres, que nós denominamos anjos, existem.
* Verdade de fé é aquela que se encontra na
Revelação e é proposta pela Igreja aos fiéis como verdade que se deve crer. A
negação pertinaz de uma verdade de fé constitui a heresia.
Essa verdade foi definida solenemente como dogma
pelo concílio IV de Latrão (1215): “Deus.., desde o princípio do tempo criou do
nada duas espécies de seres — os espirituais e os corporais, isto é, os anjos e
o mundo”. De forma igual se expressa o I Concílio do Vaticano (1870).
Os nove
coros angélicos
Existem diferenças entre os anjos, mas não consta na
Revelação qual sua origem nem seu modo preciso. É questão de livre discussão se
os anjos são todos da mesma espécie, ou se existem tantas espécies quantos são
os coros, ou se cada indivíduo constitui uma espécie por si (opinião de São
Tomás).
De acordo com uma tradição que remonta ao
Pseudo-Dionísio Areopagita,* os teólogos costumam agrupá-los em nove ordens ou
coros angèlicos, distribuídos em três hierarquias ( os nomes são tomados da
Sagrada Escritura):**
*Renomado escritor eclesiástico dos primeiros
séculos, cuja identidade não se estabeleceu ainda ao certo, durante muito tempo
confundido com o sábio convertido por São Paulo no Areópago de Atenas (cf. At
17, 34). Uma de suas obras mais célebres é De coelesti hierarquia —
Sobre a hierarquia celeste, na qual estabelece a ordem dos Anjos, deteminada
pelo seu grau de assimilação a Deus, de união com Deus, do dom de luz divina
que recebem e transmitem aos Anjos inferiores.
** Por exemplo: Serafins ( Is 6,2); Querubins ( Gen
3,24; Ex 25, 18; 3 Reis 6,23; Sl 17, 11; Ez 10,3; Dan 3,55); Arcanjos ( 1 Tes
4,15; Jud 9); Anjos, Potestades, Virtudes (1 Ped 3,22); Principados, Dominações
( Ef 1,20-21); Tronos (Col 1,16).
Primeira hierarquia - Serafins, Querubins, Tronos;
Segunda hierarquia - Dominações, Potestades,
Virtudes;
Terceira hierarquia - Principados, Arcanjos e Anjos.
Os anjos dos três primeiros coros ou primeira
hierarquia - Serafins, Querubins e Tronos contemplam e glorificam continuamente
a Deus: " Vi o Senhor sentado sobre um alto e elevado trono... Os Serafins
estavam por cima do trono ... E clamavam um para o outro e diziam: Santo,
Santo, Santo, é o Senhor Deus dos exércitos" (Is 6, 1-3 ). " O Senhor
reina ... está sentado sobre querubins" (Sl 98,1); os três coros seguintes
- Dominações, Virtudes e Potestades - ocupam-se do governo do mundo;
finalmente, os três últimos - Principados, Arcanjos e Anjos - executam as
órdens de Deus: "Bendizei ao Senhor, vós todos os seus anjos,
fortes e poderosos, que executais as suas ordens e obedeceis as suas
palavras" (Sl 102, 20).
Todos eles podem entretanto ser chamados
genericamente anjos, estando à disposição de Deus para executar suas
vontades. Embora o Evangelho, na Anunciação a Maria, se refira ao
anjo Gabriel ( Lc 1,26), isto não quer dizer que ele pertença à última das
hierarquias angélicas, pois a sublimidade dessa embaixada leva a supor que se
trate de um dos primeiros espíritos que assistem diante de Deus.
Os três arcanjos - como são conhecidos comumente São
Miguel, São Gabriel e São Rafael - pertencem, provavelmente, à mais alta
hierarquia angélica. Falaremos deles mais adiante.
Embora não conheçamos, o número exato dos anjos,
sabemos, pelas Escrituras e pela Tradição, que são muitíssimos,. É o
que lemos no livro do Apocalipse: "E ouvi a voz de muitos anjos em volta
do trono ... e era o número deles milhares e milhares"
(Apoc 5, 11). E no livro de Daniel: “Eram milhares
de milhares de milhares (os anjos) que o serviam, e mil milhões os que
assistiam diante dele” (Dan 7, 10).
Muitos teólogos deduzem que o número dos anjos é
superior ao dos homens que existiram desde o princípio do mundo e existirão até
o fim dos tempos. A razão disso é dada por São Tomás ao dizer que, tendo Deus
procurado principalmente a perfeição do universo ao criar os seres, quanto mais
estes forem perfeitos, Deus os terá criado com maior prodigalidade. Ora, os
anjos são mais perfeitos que os homens, logo foram criados em maior número.
(Fonte:
internet. Autoria:“Anjos e Demônios - A Luta Contra o Poder das Trevas”,
Gustavo Antônio Solímeo - Luiz Sérgio Solímeo)
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